terça-feira, 3 de julho de 2012

A mediocridade de Tariq Ali é a mediocridade do revisionismo

Tariq Ali
Por Gabriel Martinez

Tariq Ali é um intelectual paquistanês conhecido por suas posições anti-imperialistas. Ganhou notoriedade mundial após cobrir a Guerra do Vietnã demonstrando-se um ferrenho crítico da política externa do imperialismo norte-americano. Em artigo publicado no mês de junho no panfleto Revista Piauí intitulado “No país do grande e amado Peterson”, Tariq Ali se torna exemplo de como a ofensiva ideológica da burguesia atinge até mesmo aqueles que se dizem “críticos do sistema”. O objetivo do texto de Tariq Ali era narrar suas impressões ao visitar por duas vezes a República Popular Democrática da Coreia. Porém, queremos avisar aos leitores que, ao contrário do que podem imaginar, o objetivo de Tariq Ali ao escrever tal texto não era o de mostrar sua solidariedade anti-imperialista ao povo norte-coreano – como o intelectual fez com o Vietnã, Cuba e, atualmente, Venezuela – mas sim apenas alimentar a campanha de difamação contra a RPDC promovida há mais de 60 anos pelo imperialismo norte-americano e seus subordinados. É um tanto quanto deprimente vermos uma figura que, ainda que nunca tenha sido um revolucionário e comunista, se diz “anti-imperialista”, sustentando tais posições só para mostrar aos seus verdadeiros amos, a saber, o imperialismo norte-americano, que as “mudanças radicais” que propõem não são radicais ao ponto de realmente ameaçar a ordem vigente. E nada melhor para encobrir o revisionismo e oportunismo do que uma retórica radical-chique tão a gosto dos intelectuais oportunistas e “marxistas de cátedra” que dominam a academia brasileira e internacional.

O Sr. Tariq Ali começa o seu texto relatando sobre o episódio em que teria sido convidado para visitar a RPDC. Segundo ele, sua primeira visita a RPDC ocorreu por ocasião de um convite de um militante comunista paquistanês membro da Korean Friendship Society do Paquistão. Em uma tentativa de ser irônico – uma das características do panfleto para qual está escrevendo - nos presenteia com informações extremamente relevantes sobre o comunista paquistanês, um tipo “Baixo, barrigudo, falante e cheio de cerveja”. O motivo para o convite seria a ameaça de guerra denunciada pelo governo revolucionário da RPDC, que Tariq Ali julgava ser “infundadas”. Bom, ainda que realmente as acusações feitas pelo governo da Coreia fossem infundadas, é inegável a constante ameaça que o país sofre do imperialismo, seja no plano militar, político e econômico. Esses três motivos já seriam o suficiente para qualquer pessoa que se diz anti-imperialista demonstrar sua solidariedade ao povo norte-coreano. Fora as acusações “infundadas” do governo norte-coreano e sua ida ao Paquistão Oriental, outro motivo pesava na balança do Sr.Tariq Ali, que ainda não estava convencido em visitar a Coreia: o trânsfuga paquistanês considerava Kim Il Sung um “líder ridículo” e seu regime uma paródia da “Rússia stalinista”. Engraçado, Sr.Tariq Ali, mas “líder ridículo” e “stalinista” são justamente as alcunhas que o imperialismo emprega para criticar o Presidente Hugo Chávez, personalidade que você diz defender. “Ridículo” e “stalinista”, também para o imperialismo, era o Presidente Ho Chi Minh e os guerrilheiros norte-vietnamitas que provavelmente compartilharam alguns momentos com você em abrigos antiaéreos. Ainda para não falarmos do Presidente Mao Tsé-tung e a sua Grande Revolução Cultural Proletária. Ou seja, para o imperialismo, tudo que cheira progresso e revolução será sempre “ridículo” e “stalinista”.  É compreensível, se levarmos em consideração a posição de classe do imperialismo que, obviamente, não está lá muito interessado em revoluções. Garantimos Sr.Tariq Ali, que se perguntarmos para qualquer escriba burguês de panfletos pró-imperialistas - como a brasileira Revista Veja - o que pensariam de você, logo obteríamos a resposta: “Ridículo” e “Stalinista”. Devido ao elevado grau de putrefação de tais publicações, não duvidaríamos que utilizassem o seu bigode como argumento para classifica-lo como “stalinista”. Ainda acha mesmo que suas posições não servem ao inimigo que você diz combater?

Em seu texto o Sr.Tariq Ali traça um antecedente da história coreana, no período anterior à libertação do país das forças de ocupação japonesa. Relembra a brutal exploração e opressão sofrida pelo povo coreano durante a época em que foi colonizado pelo Japão, onde mulheres eram tratadas como prostitutas e os trabalhadores recebiam um salário de fome. Fatos verdadeiros, obviamente e que foram vividos intensamente pelo “ridículo” e “stalinista” Kim Il Sung que, aos 14 anos de idade, se engajou no movimento independentista e revolucionário, perdendo inúmeros amigos, inclusive o seu pai, Kim Hyong Zik, que morrera após ficar gravemente debilitado pelo tempo que passou na cadeia. Como o objetivo do texto de Tariq Ali não é contar a história da revolução coreana, não sabemos se o intelectual paquistanês ocultou propositalmente relevantes fatos como a fundação da Associação Nacional Coreana pelo pai de Kim Il Sung e a União Para Derrotar o Imperialismo, organização comunista que reunia jovens insatisfeitos com os rumos do movimento revolucionário no país e fora fundada por Kim Il Sung, quando este tinha apenas 14 anos.

Somente um profundo ignorante poderia afirmar que “Kim Il Sung era quase um desconhecido” quando retornou a Coreia em 1945, ocasião em que discursou para milhares de coreanos no pé da Colina Moran, lugar onde hoje existe um gigantesco Arco do Triunfo, erguido para homenagear o memorável dia. E o oportunismo do Sr. Tariq Ali é tão descarado que ele sequer esconde sua intenção de apresentar os coreanos e Kim Il Sung como figuras irrelevantes para a libertação do país. Os que desconhecem a história da revolução coreana, ao lerem o texto escrito por Tariq Ali, provavelmente acharão que a libertação da Coreia, na verdade, foi feita exclusivamente pelas tropas soviéticas e não pelos comunistas coreanos e o seu Exército Popular Revolucionário da Coreia. Tariq Ali, na prática, adota posições dominantes nos círculos pró-imperialistas que estudam a história da RPDC e que elaboram suas próprias versões da história do país, onde nela não existe espaço nem para Kim Il Sung e muito menos para o povo coreano, que durante todo o drama da luta de libertação teria sido um mero personagem secundário ocultado por maquinações de forças estrangeiras. O objetivo desses deturpadores da história é obviamente contrapor seus delírios e invenções que, muitas vezes justifica a presença das tropas de ocupação no sul da península, à interpretação histórica do próprio povo norte-coreano.

Tariq Ali, assim como a grande maioria dos jornalistas e intelectuais, verdadeiros espadachins assalariados, passa a especular sobre a trajetória de Kim Il Sung. “Quem, afinal, era Kim Il Sung?” pergunta o célebre intelectual paquistanês, recém convertido a apologista do imperialismo.  Apesar de o texto de Tariq assim sugerir, não acreditamos que ele seja um completo ignorante sobre a história da revolução coreana ao ponto de não saber o passado da vida de Kim Il Sung. Sim, Tariq Ali, Kim Il Sung esteve na China e Rússia, pois se tratam países que fazem fronteira com o norte da península coreana e milhares de coreanos moravam na região da Manchúria (China), portanto, natural que os comunistas coreanos ali atuassem.

Para completar sua total capitulação perante o imperialismo, defende a posição do mesmo sobre o início da Guerra da Coréia. Ainda que seja verdadeira a afirmação de que na parte sul da península, o povo se levantava contra a opressão perpetrada pelo governo do ditador Syngman Rhee, fantoche das tropas de ocupação norte-americana, é completamente falsa a afirmação de que o norte iniciou a guerra. Mesmo personalidades burguesas reconhecem que a versão oficial dos Estados Unidos e do governo fantoche da Coreia do Sul – de que o norte teria efetuado o primeiro disparo além do paralelo 38 - é amplamente questionável. O Sr. Tariq Ali, por conta dos seus conhecimentos sobre conflitos internacionais, certamente sabe que a RPDC sempre defendeu a reunificação pacífica do país, ao contrário da Coréia do Sul, que desde a época de Syngman Rhee defendia a reunificação pela via militar.

Tariq Ali também nos relata um dialogo que teve com Ruth Wedgwood, conselheira do facínora Donald Rumsfeld, que teria afirmado um suposto “temor” dos Estados Unidos caso a Coreia se reunifique e os militares da Coreia do Sul tomem posse do arsenal nuclear norte-coreano. É importante salientarmos que os Estados Unidos temem sim a reunificação, mas temem a reunificação caso ela ocorra nos termos da Declaração Conjunta proposta pela RPDC e que foi apoiada pelo governo sul-coreano do presidente Kim Dae Jong, que estava sendo encaminhada, até que chegasse ao poder na Coreia do Sul a atual marionete pró-imperialista, Lee Myung Bak. A proposta de “reunificação” que o imperialismo defende para a península Coreia é a de que o norte seja anexado pelo sul, daí o “temor” da conselheira que os militares sul-coreanos se apossem do arsenal nuclear norte-coreano. Ao mesmo tempo em que teme a posse de arsenal nuclear por militares, introduzem armas nucleares no país. Estranha lógica, sem dúvida. Mais um pouco e até começaríamos a pensar que a Coreia do Sul é um país independente, soberano e que não sofre nenhum tipo de controle político por parte dos Estados Unidos.

Poderíamos gastar muito mais páginas apontando todos os elementos no texto do Sr.Tariq Ali que nos possibilita chama-lo de um trânsfuga e um renegado. Mais uma vez os neotrotskistas e social-democratas, das mais diversas colorações, nos mostram de que lado estão. A julgar pelas recentes declarações do Sr. Tariq Ali de que “Cuba não é uma democracia” teríamos motivos de sobra para pensarmos que não demorará muito tempo para que os novos “ridículos” e “stalinistas” do Sr. Tariq Ali sejam Fidel Castro, Raul Castro e Hugo Chavez. O mais deprimente é que sujeitos como o Sr. Tariq Ali são considerados grandes expoentes da “esquerda moderna” atual. Na mesma lista incluiríamos o “filósofo” Slavoj Zizek, que recentemente, declarando o seu apoio a frente eleitoral oportunista grega Syriza, deu mostras do seu anti-comunismo atacando o Partido Comunista da Grécia, que segundo ele “esta vivo porque esqueceu de morrer”. Os exemplos de reacionarismo por parte de ditos intelectuais tão aclamados pelo revisionismo mundial são significantes. Com “uma esquerda” como essa o imperialismo, infelizmente, está seguro.